terça-feira, janeiro 31

O que gente não conta, conta?

Tem coisas que a gente faz questão de contar. Não importa porque, mas contar é bom, dividir, partilhar.
E, tem coisas que a gente não conta. Não conta porque não quer, porque não se sente confortável, porque não interessa a ninguém, porque a revelação não será um prazer.
Mas, e quando e gente começa a acreditar que se a gente não contou, não aconteceu? E quando a gente entra no campo de não contar sequer para o nosso travesseiro?
Um caminho que oferece enorme perigo, pois que já não se trata de não divulgar, mas sim de ignorar, negar.
Pode ser uma coisinha boba, pode ser um crime odioso. Pode ser qualquer coisa. A pergunta que se faz é: Isso conta?
Bem no início do ano eu passei por uma situação um tanto vergonhosa, daquelas que a gente repensa como fala, o que fala e de que jeito fala. Realmente, para negar, somos rápidos.
Bom, eu fui a uma consulta no gastro, estava com a digestão lenta, uma sensação chata, e cheguei lá reclamando desse inconveniente. Ele pegou uma folha de papel, uma caneta, e me perguntou o que eu tinha comido e bebido nas festas de final de ano, e ele então iria anotar TUDO.
Engoli seco e comecei a contar, falando quase para dentro, pausadamente, como uma oração, omitindo algumas coisas, confessando outras, colocando a culpa nos temperos de outra mão, e ele então parou e me falou, sério: – Se você não me contar direito, eu vou entender que você só veio aqui para passear e sequer acredita que eu possa te ajudar.
Além de ter ficado de cara no chão, percebo agora uma lista infinita de sentimentos, emoções e outras tantas coisas que a gente não conta sequer para nós mesmos, ou floreia, decora, enfeita, fala partes, descarta outras.
Pode ser bobo, pode ser sério. A pergunta que fica é: O que conta na vida para ela valer a pena ser contada?

Aos juízes de plantão: Nos concedam uma folga, julguem suas próprias vidas!

Justiça é um tema lindo, tem a ver com igualdade, com proteção e equilíbrio. Já é uma tremenda virtude tentar ser uma criatura justa. No mínimo, pensar no assunto.
Mas entre exercer a justiça e julgar, aí tem uma rodovia esburacada de distância. A justiça que serve para mim, tem que servir para você e para todos.
Não existe essa concepção de justiça personalizada, que castiga uns e deixa impune outros. Sim, existe, e lamentavelmente vivemos uma era de justiceiros e transgressores, brigando por seus espaços, ainda que tomando territórios que não lhes pertence.
Aos juízes de plantão, aos que subitamente se vestem de justiça e se creem defensores e formadores de opiniões, se não fosse a platéia ávida por julgamentos e condenações, o que lhes restaria? A quem convenceriam?
A velha e conhecida máxima: – Macaco, olhe o seu rabo! – Nunca foi tão perfeita para essa classe de juízes da vida alheia, que ficam à espreita para pegar um deslize, uma derrapada, uma confissão mal contada, e então julgar, condenar e espalhar o fruto de suas duras conclusões.
Caros juízes! Ainda que eu não acredite na bondade de suas intenções, e ainda que eu não me lembre de ter solicitado ou acatado seus julgamentos, por uma questão de justiça, entendo os propósitos do seu passatempo. É justo buscar algo para se prender ou se entregar quando a própria vida não anda lá muito interessante. É justo mas não é bom!
Bom seria se, ao invés de juízes, buscassem ser mais parceiros, tentassem entender que o mundo e como se vive nele, é uma experiência individual. Julgar um crime é correto. Julgar um comportamento, uma escolha, um amigo, um irmão, um amor, uma possibilidade, uma esperança, é demonstração da mais profunda inabilidade humana.
O que é bom para mim e não é bom para você, ainda assim pode ser muito bom para mim. E durma com um barulho desses, ainda que batendo o martelinho e murmurando: Eu condeno!

sábado, janeiro 28

A boa briga: Enfrentar os demônios do passado

Brigar por razão, por vaidade, por exibicionismo ou até mesmo maldade, ah, essa briga é tola!
Brigar por vontade de fazer justiça, para defender um afeto, garantir direitos e espaço, aí já começa a melhorar…
Mas, briga boa, aquela que se reza para não entrar, mas depois paga para não sair, é a briga urgente e necessária com os demônios do passado.
Os demônios que espreitam a vida, que sugerem a repetição de reações equivocadas, que fazem o tempo presente parecer inútil e o futuro, desanimador.
Há um demônio comum que mora no passado de quase todo mundo. Agressivo, asqueroso, implacável. Usa a culpa como arma, e a chama ao menor sinal de liberdade. A briga com esse é séria, mas vale muito a pena tentar.
Companheiro desse, um demônio sonso, que evoca despretensiosamente as terríveis sensações de insegurança sentidas em algum momento lá atrás, e que lá deveriam ter ficado. Mas ele sabe onde estão escondidas e as apresenta sem avisar, roubando-nos o chão. Com ele, funciona bem a indiferença.
Um menorzinho mas não menos perigoso, o demônio da chantagem infantil. Esse nasceu da oportunidade, daquela ocasião em que um apelo funcionou tão bem, que resolveu ficar para sempre. E, mesmo não sendo mais a versão original, usa e abusa das caras e bocas para conseguir o que deseja. Ainda que não tenha mais idade para isso. Discutir não adianta muito, é melhor mesmo colocar de castigo, para pensar.
O demônio da malcriação, aquele que não sabe ser contrariado, que bate pé e se joga no chão. Esse, agora mais velho, parte até para o surto quando não se sente confortável com as respostas que recebe. Esse merece uma boa bronca, além da lição de educação que lhe falta.
E tantos outros, vestidos e revestidos das mais variadas temáticas, que assombram e modificam nossas condutas, somente porque em algum momento do passado, foram acolhidos.
Somos nutridos por anjos e demônios, mas, e acima de todas as influências, somos o que queremos ser, e se não estamos nos sentindo donos da vida, o melhor é partir para a briga, conquistar o espaço e fazer as escolhas. O passado que fique com seus demônios. O presente que crie o ambiente para o que irá povoar o futuro.

segunda-feira, janeiro 23

Pessoas livres não enclausuram outras pessoas

Pessoas livres têm uma perspectiva interessante do mundo e das relações. Não cultivam o medo dos rompimentos, não constroem armadilhas para prender outras pessoas.
Pessoas livres enxergam beleza na fragilidade dos encontros, se fortalecem de momentos felizes, vivenciam as fases difíceis e comemoram intensamente as superações e progressos.
Não alimentam neuroses, não sentam ao lado de paranoias, não dão conversa para os pensamentos possessivos. Sabem que nada nem ninguém lhes pertence e jamais pertencerão. Pessoas livres convivem com idas e vindas sem grandes dores. No máximo, saudades e recordações, até mesmo as tristes e doloridas.
Ninguém jamais será aprisionado por uma pessoa livre! Ainda que possa parecer desamor, uma pessoa livre não concebe a prisão como forma de vida. E tanta gente se querendo aprisionar, obedecer, se submeter… Uma ordem não natural das coisas que a gente acaba se acostumando, e as pessoas livres transgridem, ainda bem.
Da mesma forma, nunca será possível encarcerar uma pessoa livre. As mais fabulosas e criativas maneiras terminarão em fracasso e frustração. A pior das notícias para os dominadores de plantão.
Ser livre é estado de espírito. Estar livre é momento sublime. Quando nada prende, a gente sabe exatamente onde e com quem quer estar. Pessoas livres nos mostram o caminho, mas quase sempre preferimos as correntes e os segredos dos cadeados. E damos passos tão curtos quanto pequena é a corda que nos aprisiona.
Se o mundo é dos que não se acovardam, a liberdade é para os que enfrentam o que vida lhes oferece. Aceites, recusas, êxitos, fracassos, amores intensos, infidelidades, mentiras, verdades… Liberdade é conviver com tudo o que faz parte da vida sem negociar o direito de viver plena e pessoalmente.
Não há proteção nem conforto, tampouco promessas e esperanças, que paguem o preço de uma liberdade. Pessoas livres sabem disso e aprendem bem cedo que, mais valem passos errantes no mundo, do que uma bola de ferro nos tornozelos.

quinta-feira, janeiro 19

A vida só cresce se você abrir espaço

Quantas vezes achamos a vida chata, tediosa, arrastada, atrasada… E provavelmente, é assim mesmo que a vida está.
Não é tarefa fácil oxigenar a vida. A gente tende a observar mais do que agitar, e, às vezes, sequer reparar.
A vida precisa de espaço, de terreno livre, de boa luz e grandes planos! Ela só cresce se você retirar as barreiras, mover os entraves, afastar as sombras e limpar a bagunça.
Uma vida em expansão clareia as ideias, traz consigo muitas inspirações, organiza o tempo para haver tempo para tudo. A vida em crescimento fica leve, flutua, inspira mudanças e novos objetivos.
Mas, sem espaço, ela murcha, encolhe, entristece e até morre.
A vida sem vida é depressão. A depressão é a vida consciente de que foi vida, mas que não sabe voltar a ser.
Luta-se para conquistar muitas coisas. Antigamente, territórios. Nos dias de hoje, bens e sonhos de consumo. Mas, sem espaço para vida, terão seus valores reduzidos até o ponto de nada valerem se a vida estiver sem graça.
E quantas vezes a vida se manisfesta, sábia, de graça! Naquele momento em que ela encontra um espaço, no meio do caos diário, respire fundo e cresce!
A vida é semente, terra, fertilizante e regador. De nós, ela só pede o vaso, a jardineira, um cantinho ou o jardim. O que vai determinar o seu crescimento é o que vamos oferecer de espaço.
Escolher entre ter para somente si ou ceder para a vida multiplicar. E ainda ter vida para enfeitar o jardim de quem não consegue enxergar além das pedras.

segunda-feira, janeiro 16

Jamais concorde somente para agradar!

Não vale a pena, não compensa, nem recompensa.
Nem mesmo para impressionar, garantir um lugar, um placar, uma esperança.
Concordar para agradar é perder todo e qualquer poder de decisão, é entregar-se ao que favorece ao outro, evitar a contrariedade alheia, ainda que passando por cima de si mesmo.
Quem merece afinal essa concordância absolutas? Companheiros, filhos, amigos, chefes, ídolos, mitos, deuses e forças sobrenaturais?
A quem se dedica a morte de uma escolha própria?
De quem se cobra o preço de uma obediência cega?
Concordar é consentir. Consentimento carrega enorme responsabilidade.
Se alguém te chantageia para obter concordância, saiba que, ao concordar pela primeira vez, se iniciará um processo sem fim, dominador, tirano.
Se alguém te suplica concordância e sinaliza que talvez o afeto diminua em caso de negativa, esteja ciente de que a moeda de troca já está há muito desvalorizada.
Se alguém faz manha e manobras para arrancar a sua concordância, enxergue nessa atitude todo o egoísmo que ela carrega, e não espere um retorno na mesma medida, porque não acontecerá. Eduque, se possível, discordando.
Quem não aceita uma opinião contrária, uma negativa legítima e argumentada, um outro ponto de vista, jamais libertará quem, um dia, concordou somente para não decepcionar.
Pratique o posicionamento natural, o enquadramento de suas preferências em qualquer contexto que seja. Desde a negativa necessária à criança pequena que faz birra para conseguir o que quer, até mesmo às relações de amizade e intimidade.
Citando a velha e verdadeira frase: Um negócio só é bom quando é para ambas as partes. Esse é o caso em que todos concordam e todos ganham. Fora disso, só restam a tirania e a covardia.

sábado, janeiro 14

Quando eu disse sim ao meu corpo!

O corpo fala, comunica, tanto seduz quanto repele, suplica, ordena, humilha e se submete. O corpo se manifesta de várias maneiras, até quando tenta se esconder.
O corpo ganha voz quando a boca se cala, perde o controle quando se embriaga e os sentidos quando se acovarda.
Tem gente que não aceita o corpo. Convive com ele em estado de tensão e constante conflito. Não é mais um instrumento divino que abriga tudo o que se é. O corpo se torna um inimigo para a toda a vida, e, como castigo, recebe maus tratos e grande desprezo.
Tem gente que deseja o corpo alheio, persegue o modelo dos sonhos com tamanho fanatismo, que distorce o corpo até as últimas forças e dotes naturais.
Tem corpo que parece não ter gente dentro. Tem gente que parece não ter corpo que a prenda.
Eu vivi boa – e bote boa nisso – parte da vida em luta com o corpo. Até os dias de hoje ainda discutimos nossa relação, mas agora em outro nível, um querendo bem ao outro.
O dia em que tomei posse definitiva do meu corpo, não lembro. Mas, sutil e curiosamente, um dia percebi que não era mais tempo de briga. Tinha chegado o momento de fazermos as pazes e nos ajudarmos mutuamente.
O espelho ficou fora da conversa. Um objeto jamais poderia ter voz de comando nessa relação, e ele teve, por décadas. Não só ele, mas as revistas, as novelas, os anúncios e as fotografias. Todos, com intenção ou não, contribuindo para ficarmos “de mal” por muito tempo.
Por isso, nenhum deles foi consultado quando resolvemos nos entender. O corpo parou de lutar para contra minhas investidas e eu, abri mão de tentar faze-lo ser o que jamais será.
Tomei posse do que é de fato meu e dele cuido como achar melhor.
E, juntos, não caímos mais nas manipulações e sugestões que escondem o tempo passando e a vida escorrendo, enquanto corremos em direções contrárias.
De agora em diante, melhores amigos! Saúde!

quinta-feira, janeiro 12

Não espere ver o outro sangrar para constatar que machucou

Não aguarde muito tempo para deixar a consciência falar e trazer as malas pesadas da culpa. Não conte com o esquecimento alheio. Quem é ferido não esquece fácil, porque a dor não deixa.
Se num momento de raiva você machucou alguém, o momento imediatamente seguinte deve ser dedicado ao retorno do equilíbrio, às desculpas e consolo de quem foi injuriado.
Não espere o sangue aparecer para se dar conta que feriu alguém. As feridas secas e sem hematomas são as que mais doem. E as cicatrizes fecham e depois abrem novamente, para se alimentarem de rancor e, muitas vezes, vingança.
Não ouse achar que o perdão já está garantido. Não recolha suas pedras atiradas contando piadas. Não faça pouco caso do que o outro sente quando ferido.
Muitas vezes, ser machucado não é tudo. Ainda pior, é sê-lo por você, de forma inesperada. A confiança despedaçada, a espontaneidade que dificilmente retornará, a má impressão que sempre acompanhará…
Os grandes feridos dão entrada nas emergências de hospitais buscando cuidados urgentes, de quem estiver de plantão. Os profundamente feridos, caem num precipício profundo e cheio de ecos. Caem de susto, de tristeza, de incredulidade e decepção.
Não seja você a criatura que empurra. E, se por infelicidade ou incapacidade o fizer, trate de pular logo atrás, com um corda bem grande e pesada, e traga de volta, nem que seja nas costas, quem foi ferido por suas razões.
Não se iluda ao acreditar que agressões, veladas, silenciosas, vociferadas, enganosas, maldosas, não trazem de volta sérias consequências.
No calor do momento, escolha não ser o agressor. E se esbarrar com alguém sangrando, ofereça um curativo.

terça-feira, janeiro 3

Capriche nas promessas de final de ano!

Prometa para si, jamais para alguém! Por si e por mais ninguém.
Prometa mesmo um monte de coisas! Quem sabe algumas delas cheguem a ser cumpridas. A vida é assim mesmo, de certezas e desistências, de resoluções e ponderações, “agora vai” e “não foi dessa vez…”
Voltar atrás é escolha, desistir é processo, desfocar também é ponto de vista.
O segredo é saber o que tem margem de negociação. A ferro e fogo ninguém vive e essa coisa de manter o foco pode ser repressora, dependendo da dose. Nosso melhor caminho é o que nos faz livres e autônomos. Quando escolhemos renunciar a alguém ou alguma coisa, sabemos ou ao menos desconfiamos das consequências, mas ainda assim pagamos para ver.
E crescemos com os acertos, e, mais ainda com os erros. O tempo é que passa e não volta, talvez a maior das perdas. A equação tem esse elemento de de peso forte!
As promessas sofrem ajustes e desgastes com o passar do tempo.
Então, para otimizar a lista de promessas de final de ano e ainda ficar de bem com o tempo que nada espera, aí vão sugestões de quem já deixou de cumprir as mais comuns e convencionais:
– Não prometa dieta. Prometa se apaixonar. Por si, por alguém, por uma causa, pela vida que quer ter. O corpo responderá feliz!
– Se você não faz o tipo fitness, não prometa academia cinco vezes por semana. Ao invés disso, prometa comprar uma bicicleta, um patinete, jogar bola com os filhos, nadar, caminhar, respirar, dançar, se valorizar!
– Prometa todas as reconciliações que estiverem pendentes, todos os perdões a dar e pedir, todos os polimentos nas relações que estiverem arranhadas!
– Não prometa adquirir mais itens de consumo do que lugares a conhecer, amizades a fazer, lembranças a colecionar.
– Prometa por fim, jamais cumprir uma promessa absurda, que não seja em favor do seu crescimento, paz e saúde para desfrutar a vida, nem mesmo em nome de um amor – que não sobrevive apenas de promessas.
Feliz Ano Novo! Que as boas promessas se realizem e, as nem tanto, a onda leve!

Quem povoa os salões da sua saudade?

Saudade é um sentimento estrangulador. Saudade faz rir e faz chorar, dá medo e coragem, acorda e desmaia.
Saudade boa, nostalgia, nuvem de lembranças e tentativa de revivê-las.
Saudade triste, melancolia, momentos que ainda não cabem nas gavetas da memória sem doerem um tanto.
O que provoca saudade? Tem saudade de gente, de tempo, de lugar, de cheiro, de som, de alegria e até de dor.
Quem vive e frequenta os salões da sua saudade?
Na minha saudade mora gente que jamais se conheceria, mas hoje povoam o mesmo salão. Na minha saudade dançam figuras do passado, danço eu mesma de outro jeito, desfilam pequenos momentos que me arrancam suspiros, passam cenas impregnadas de memórias.
A saudade tem poder de dominar os pensamentos por um instante. Quando se sente saudade, não se sente mais nada, não se pensa em mais nada, não se ousa reagir.
Depois de passada, a saudade deixa um desejo de reação. Se não se pode acabar com ela, é preciso falar dela. É urgente contar a alguém sobre ela.
A saudade vem e nos traz a certeza da vida que já vivemos, da saudade que também provocamos, do tempo que está passando, do pouco que nos comprometemos.
Viver de saudades é duro. O tempo passa mais rápido de propósito, só para provocar mais saudades.
É hora de olhar para dentro dos salões da sua saudade, identificar rostos, lugares e oportunidades. O que não vai mais voltar, vai ficar na saudade. O que der para recuperar é tarefa para agora! O tempo não aguardará a saudade passar.
Entre nesse salão, e se a porta estiver fechada, entre pela janela, pela chaminé, pela saudade de quem está lá dentro, e resgate o que for possível. Liquide a saudade em vida, para que ela fique somente com o que já não pode mais retornar.

Por que a dor conecta mais do que o amor?

A dor é sentimento que não se compartilha. A solidariedade se aproxima da dor para ficar juntinho, oferecer seu carinho, não deixar a solidão se aproximar muito. Mas a dor é de quem a abriga. Ninguém quer sentir dor, mas ela vem. Ninguém quer a dor do outro, mas quer estar por perto, consolar, aguardar o alívio.
A dor conecta as pessoas mais do que a amor. Talvez porque o amor caia nas teias da desconfiança. Talvez porque o amor se apresente contagioso, divisível, enciumado, egoísta, tirano, inseguro…
O amor tenta ser compartilhado de vários jeitos, mas não encontra tanta e tão rápida adesão quanto a dor. Vê-se um movimento muito mais agregador em torno da dor. A dor amolece os corações. O amor, nem sempre. A dor evoca a generosidade. O amor, nem sempre. A dor cria heróis e mitos. O amor, nem sempre.
Que medo é esse que se tem do amor? Dizem que as pessoas se afastam do amor para evitar a dor. Mas, depois recorrem a ele para aplacar a dor. A dor de outro, mas ainda dor.
A dor que machuca e faz sofrer em um, inspira amor e solidariedade em outro. O amor que anda disponível e faminto por aí não interessa a um nem a outro. É bonito de ver, e só.
O mundo é muito louco mesmo. Quanto mais dor, mais amor. É por ela que ele se conecta.
A pergunta que fica é: Por que a dor conecta mais do que o amor, se o amor é capaz de evitar tanta dor?