sexta-feira, fevereiro 25

Quando um não quer, o outro insiste!

- Esse vestido não fica bem em você.
- Mas é pra ficar em casa, tudo bem.
- Não vá sair assim.
- Não vou, já disse que é pra ficar em casa, está calor, eu estou pra lá e pra cá.
- Não sei como você não vê que essa roupa está esquisita. Está mais curto atrás.
- Quanto você quer pra ficar quietinha? Tá certo, olha a TV, o programa que você gosta.
- Você nunca teve olho bom para roupa.
- Quer lanchar?
- Não, quer que eu conserte essa bainha?
- Não!!! Deixa a minha roupa em paz!
- Uma mulher não pode ficar assim, desleixada.
- Mas só tem nós duas aqui e eu estou arrumando as coisas.
- Olha, não vá sair assim.
- Você tá com vontade hoje, héin.
- Vontade de que? Não vou sair, vai chover.
- Tá bom.
- Mas tira esse vestido, está horrível.
- Deixa meu vestido, mãe!
- Eu sempre te falei e você não aprendeu.
- Ai, minha paciência está no final.
- Roupa feia, sem forma.
- Mãe, alivia!
- Não vou falar mais nada, você que sabe.
- Isso!
- Mas eu não saio com você assim.
- Não vai sair não, eu prometo.
- Mas não vou mesmo. Imagina, podendo sair arrumadinha, bonitinha...
- Mãe, me larga!
- Eu? Eu nunca me metí na sua vida.
- Então tá bom. Chega, né?
- Sua cabeça é seu mundo.
- ...
- Mas imagina, chega alguém aqui e você com esse vestido.
- Não vai chegar ninguém.
- Mas se chega, logo vai pensar: Essa mãe não ensinou nada pra ela.
- Ah, é isso que te preocupa?
- Não, nada me preocupa. Eu não me visto assim, toda relaxada. Minha consciência está tranquila.
- Pode ficar, não vão te culpar.
- Nem podem. Se culparem, vou contar o gênio que você tem.
- Mãe, sério. Já tá enjoando.
- Isso que dá, não obedece ninguém.
- Eu tenho 45 anos!!!
- E ainda não aprendeu nada. Mas agora eu não vou ensinar mais, porque não aguento seu gênio.
- Tudo bem, não precisa mais ensinar.
- Mas me dá um desgosto...
- O que?
- Esse vestido, você sair assim.
- Eu não vou sair agora, estou aqui com você.
- Ah comigo pode ficar toda esculhambada.
- Mãe, não é isso.
- Tudo bem eu não ligo mesmo.
- Olha, vamos fazer o seguinte: eu vou tomar banho pra gente não brigar e depois você vai comigo na farmácia pra comprar um remédio seu que está acabando.
- Não sei se eu vou.
- Tá bom, a gente resolve.
...
...
- Vamos lá então? Depois a gente compra um lanche e volta.
- Mas você trocou de roupa de novo? Olha, você precisa se tratar, arrumar um marido. Que fogo é esse? O que é que está acontecendo? Tá querendo me enganar?
- Não, eu troquei o vestido que você detestou.
- Eu? Imagina se eu me meto na vida de alguém. Você está querendo briga, mas eu não não! Sai pra lá, não vem não! Eu tô quieta no meu canto e você vem me provocar. Sempre foi assim, com esse gênio ruim. E tem mais, eu não ía dizer, mas agora vou: Esse vestido está horrível em você! Chata!

quinta-feira, fevereiro 17

Enquanto isso, no mundo dos negócios...

- Panificadora, bom dia!
- Bom dia, tudo bom? O senhor produz pão de queijo sabor goiaba?
- Como?
- Ah, eu também estranhei quando ouví isso na reunião, mas é um "conceito" novo que o departamento criou e tacou no meu colo pra eu me virar, digo, me passou essa oportunidade de desenvolver o projeto.
- Mas pão de queijo de goiaba deve ser horrível!
- É, deve ser sim, mas encaixa perfeitamente ao conceito de "moradia tranquila= pão de queijo, minas, uai, trem...e acolhedora= bichinho da goiaba", entendeu?
- Não.
- Deixa pra lá, é bem difícil mesmo, até porque, foram necessárias vááááárias reuniões conceituais e incontáveis brainstorms.
- Pra senhora vir me pedir pão de queijo de goiaba?
- O senhor faz ou não faz?
- Quantos você vai querer?
- Pela demanda que estamos projetando, uns 20 mil.
- Ah, então eu faço. Faço até de couve.
- Mas a verba é curtinha, curtinha. Talvez só faça uns 200.
- Tá de brincadeira comigo?
- Antes estivesse moço. Olha que eu tentei. Sugerí pão de mel, pão de batata, pão de ló, pão duro... tudo que me pareceu acolhedor, ou não. Mas sabe, departamento de marketing é assim mesmo, todos tão criativos.
- Então, deixa eu ver aqui. Pra 20 mil, sai a 20 centavos cada um. Pra 200, sai a 20 reais.
- Nossa moço, mas que diferença.
- Nossa moça, mas que trabalheira você vai me dar só para atender ao seu cliente que quer pão de queijo de goiaba! É pegar ou largar. Pagamento adiantado e coleta do produto aqui. Tenho medo de colocar um produto desses no caminhão de entrega e levar uma multa por carregar explosivos.
- Pelo menos o senhor tem senso de humor.
- Tenho nada, quero é faturar. Me liga quando for fazer a encomenda que eu te passo o número da conta para depósito.
- O senhor não pode vender a prazo? Sabe o que é? É que o cliente só paga depois, em 30 dias, e a gente fica adiantando tudo. Não podemos fazer uma parceria?
- Minha filha, parceria eu só faço com a minha caixa registradora. E eu vou adiantar dinheiro pra empresa rica?
- É, não vai. Deixa que a gente adianta então.
- Tá, tchau, tenho mais o que fazer.
- Tá bom, muito obrigada pela gentileza, eu te lig...tu tu tu tu tu


- Oi cliente querido, bom dia!
- Oi, fala logo, porque o dia hoje está um inferno! (e eu queimando nesse mármore)
- É sobre os pães de queijo sabor goiaba! Acho que conseguí!
- Ah, claro. coisa básica, como não conseguiria?
- É, foi relativamente fácil, só fiz 36 ligações e passei 4 horas buscando, mole pra nós!
- E aí? Já estão prontos?
- Não, que nada, vou te passar o orçamento antes, porque o panificador cobra adiantado.
- Como cobra adiantado? ele sabe pra quem está vendendo?
- Sabe e está cag..ndo.Não, a gente preserva o nome do cliente.
- Dá uma olhadinha no orçamento!
- Nossa, que roubo!
- É que ele explicou que tem que usar bloridrato de trusoneda cor de tijolo para estabilizar a mistura, para ficar homogênea, e isso é caro.
- Fala pra ele colocar farinha que é a mesma coisa!
- Ah, não posso falar para ele como trabalhar, não é? como você faz comigo
- E essa taxa sua, o que é isso?
- É quanto a gente cobra para trabalhar para você, digo, para seu projeto.
- Nossa, eu pensei que vocês fossem parceiros, mas vejo que não são!
- Claro que somos (mais da nossa caixa registradora), mas temos um custo operacional (porque já sabemos que não pagam pelas nossas cabeças) . Afinal, também trabalhamos por lucro.
- Que olho gordo! Já trabalham comigo, se reportam diretamente a mim, sabem das minhas idéias geniais em primeira mão... e ainda querem lucro! Olha, a concorrência vive aqui me implorando um chance héin!
- A gente melhora essa taxa.
- Bom mesmo.
- Então, vamos fazer os pães de bichinho de goiaba?
- Pães de queijo sabor goiaba!
- Isso, bora?
- Veja com o fornecedor se ele faz 200 pelo preço unitário de 20 mil.
- Ele não faz, não é bobo.
- Tenta, às vezes ele é.
- Sem chance.
- Então vamos fazer só os 200 mesmo.
- Ok, vou encomendar.
- Obrigado...tu tu tu tu tu

- Oi cliente, tudo certo! Os pães de queijo sabor goiaba chegam amanhã na primeira hora, enfeitadinhos, com um bichinho em cima.
- Ué, minha assistente não te ligou?
- Não, por que?
- Porque nós mudamos todo o conceito da campanha e agora vamos precisar de risóles em formato caramujos, para remeter a uma residência recheada e deliciosa. E dentro, um casal de camarões.
- Entendi. Mas e os pães de goiaba já pagos?
- Você vai arcar com esses prejuízos, porque está errada de não me ligar a cada meia hora para perguntar se eu lí e-mails e, se não os lí, ler para mim. Deveria até me ligar para saber se esquecí de falar algo. Minha filha, eu sou do departamento criativo dessa empresa, não posso ficar me preocupando com detalhes, entendeu?
- Perfeitamente!

segunda-feira, fevereiro 14

É direito fazer pedido de remédio?

-Defensoria Pública, bom dia! (Dezembro de 2010)
- Olá, bom dia, eu soube que minha mãe pode obter os medicamentos para tratar a Doença de Alzheimer através do governo, gostaria de saber quais são os procedimentos.
- Ah, é pedido de remédios (oi,pedido?)? Anote o endereço e os documentos para levar: Av. General Justo 335, mas olha, a porta da frente está quebrada, você tem que vir pelos fundos. Os documentos: xerox de identidade, CPF, comprovante de residência, de renda, laudo médico e receita. Você vai representar a sua mãe? Se for, leve todos os seus também. Mas agora, só em janeiro, a partir do dia 7.
- Ok, obrigada. E qual é o horário de atendimento?
- De 8h às 16h, todos os dias, de segunda a quinta.
- Obrigada.

-Oi, aqui é a Defensoria? (Janeiro de 2011)
- É pedido de remédio (oi de novo)?
- Sim, é pedido!
- Sobe aqui a escada, no final do corredor.
- Obrigada.
Cena: Duas atendentes e uma criança, todas na mesma mesa, todas com o mesmo sono, foi a impressão que ficou.
- Oi, quero dar entrada na ação para medicamentos.
- Ah, é pedido? Tem que descer e falar com a Fulana. Qual é o seu nome?
- Cidadã. Sem sobrenome, nem padrinho.
- Tá, vai lá embaixo.
- Obrigada.

- Oi, estive lá em cima, fui orientada a procurar pela Fulana.
- É pedido de remédio? Beltrana, atende essa aqui? (porque agora estou vendo os produtos da Avon que chegaram e estão embaixo da mesa).
- Oi, eu trouxe a documentação que informaram por telefone.
- Ih, está tudo errado. Tem que ter o CID da doença, o CID de cada medicamento, e trazer o laudo e a receita em 6 vias originais, porque a defensora não gosta de conferir xerox.
- Ah, sei, Mas e se o médico não quiser escrever 12 folhas?
- Aí complica.
- Ok, obrigada.

- Oi Dra, tudo bom? Então, eu estou tentando obter os medicamentos que a minha mãe usa, já que eles ultrapassam o salário mínimo que ela recebe de aposentadoria, mas preciso muito da sua ajuda. Lá na Defensoria me orientaram blá blá blá...
- 6 originais? Ah, não mesmo! Isso é preguiça daquele povo. Vou fazer 2 originais da receita e do laudo e tá muito bom! Isso já está me enchendo.
- Ah tá, obrigada, obrigada mesmo.
- Imagina. Mas olha, eu acho que você vai voltar aqui. Boa sorte.

- Oi, eu estive aqui na semana passada e a Beltrana me deu essas orientações assim assim e está tudo aqui, tudinho.
- Deixa eu ver... você não trouxe a declaração de hipossuficiência financeira?
- O que é isso? Sua colega não me falou nada.
- Ela sempre esquece. (ah bom!)
- Pega essas duas aqui e leva pra sua mãe assinar. O resto está certinho.
- Ok, obrigada.

- Oi, a Cicrana está?
- Não, ela não veio hoje.
- E outra pessoa pode atender?
- É pedido de remédio?
- É, né?
- Me passa seu nome e aguarda sentadinha alí. Vai me dando os documentos para conferir.
- Ah, muito obrigada!
- Cadê o seu comprovante de residência?
- É o mesmo, eu moro com ela.
- Mas precisa do seu.
- Mas os medicamentos são para ela. Sou só a procuradora dela.
- Não sei, vou perguntar pra defensora. Olha hoje está demorando pra caramba, vou logo te avisando. Essa defensora é nova e está com mania de ler o processo inteiro antes de liberar.
- Ahhh... que coisa. Isso é bom ou ruim?
- Depende do seu ponto de vista.
- Ok.
- Ela "liberou" seu comprovante de residência, vamos lá! Não sei nem por onde começar.
- Quer que eu te ajude?
- Não, só aguarde. Nossa, sua mãe toma 8 remédios? Fica muito caro? (não, eu vim PEDIR porque minha vida está chata e busco mais emoções).
- É, fica um pouco caro sim.
- Ela não tem mais filhos pra dividir?
- Não, sou filha única.
- Muito ruim ser filha única.
- Depende do ponto de vista.

tempo...tempo...tempo...tempo...tempo...

- Olha, consegui: confere aqui. Essa é a liminar para você levar lá no IASERJ para esses três remédios. Você dá entrada lá e eles te ligam quando os remédios estiverem liberados.
- Nossa, que bom. Tem prazo?
- Prazo não tem.
- Ah...
- De lá, vão te encaminhar para o local onde é para pegar.
- Ok.
- Essa é a ação. A gente vai dar entrada, daqui há 5 dias você vem buscar o cartão branco. Aí você vai saber qual é a vara. E depois disso, não tem mais nada com a gente.
- Ok, obrigada.

- Oi, tenho aqui uma liminar para medicamentos. (Fevereiro de 2011)
- Segundo andar.
- Obrigada.
Cena: uma caixa de papelão com senhas em papelão também.
- Número 9 (cheguei cedo).
- Oi, bom dia. Trouxe essa documentação da defensoria.
- Minha filha, não é bem assim. Você tem que preencher um cadastro, trazer xerox de todos os documentos, a receita separada, o laudo separado. E olha, mandar o seu médico preencher esse papel aqui. Só te aviso uma coisa: De cada 10 médicos, 8 preenchem errado.
- Então, por favor, me explique uma coisa: o que fui fazer da defensoria, está errado?
- Ah, minha filha, aquelas estagiárias lá da defensoria não querem nada com nada. Elas sabem tudo o que é pra fazer, mas só enrolam. Elas querem mais é despachar o sujeito de lá.
- Poxa, fui lá 3 vezes.
- Não quero te desanimar não, mas aqui você deve ter que vir mais umas 3.
- A D. Cidadona é a Sra. sua mãe?
- É, a Sra. minha mãe.
- Se eu fosse você, colocava tudo junto na ação.
- Mas então por que a defensora não colocou?
- Porque já te falei, ninguém quer nada lá.
- Obrigada.
- Vai com Deus, minha filha.

- Defensoria, boa tarde.
- Oi, eu blá blá blá e por final, ele me falou para colocar tudo na ação.
- Mas é uma doença ou mais de uma doença?
- É uma doente, um laudo e 8 remédios.
- Então, agora é lá na vara onde vai correr a ação. Quando a senhora pegar o número do processo, liga pra gente pra saber onde é a vara.
- Obrigada.
- Não tem de que. Posso ajudar em mais alguma coisa?

Em tempo. O número do CNPJ do Governo do Estado do Rio de Janeiro é mais ou menos assim xx.xxx.xxx/xxx1-71. Dei risada lendo o número colado nas pilastras da Defensoria.
Acho que rí cedo demais.